O Projeto de Lei 2630 /2020, que pretende colocar fim à prática da mentira na internet, ameaça não somente os criadores de NOTICIAS FANTASIOSAS, mas principalmente o que propagam tais mentiras.
O fenômeno das fakenews não atinge somente o Brasil… Mas é aqui que percebemos um numero gigantesco de pessoas que se dizem “DE DEUS”, se posicionando contra o PL, ou seja, a favor da MENTIRA.
Mas como nos livros de super heróis, se o mal ainda vive é porque a história não chegou ao fim. Na nossa realidade, se os produtores de FAKENEWS ainda trabalham livremente, é porque essa história ruim ainda não chegou ao fim.
O Brasil e o mundo clamam por uma legislação que possa conter a violência e as notícias falsas nas redes sociais. Responsabilizá-las pela veiculação de conteúdos criminosos, como os demais meios de comunicação, é um dever do Estado. A situação ultrapassou os limites do razoável. As redes sociais, que se esperava ser uma avenida da internet, para o aprimoramento da democracia, voltam-se contra ela e se tornam uma ameaça global.
A democracia está ameaçada por uma lógica de negócios predatória, de predomínio absoluto do interesse privado em detrimento do interesse público. Os clicks giram as rodas das fortunas, em ações nas bolsas. Ao mesmo tempo, esgarçam o tecido social ao servir de meio para propagação de desinformação e violência. Eleições estão sendo manipuladas por estruturas políticas e de comunicação gigantescas, sustentadas em fake news. Em 2018, tivemos uma eleição no Brasil dominada por uma campanha de desinformação e pregação explícita de violência, com a conivência das big techs, que não demonstram nenhum compromisso civilizatório com a sociedade. O mesmo já aconteceu e está acontecendo em outros países.
Segundo pesquisa do Reuters Institute, durante a pandemia, o brasileiro apareceu como o povo mais preocupado do mundo com a propagação de informações falsas, (82% da população).
Um estudo das Nações Unidas concluiu que 34% das pessoas foram convencidas pela narrativa de que tratamentos alternativos curavam a Covid-19; alegações de que a pandemia foi planejada atingiu 32% dos brasileiros; efeitos colaterais do imunizante atingiram 34% do público analisado. Quanto à rejeição da vacina, chegaram a 18% e que o imunizante usaria microchips, a 15%. A barreira contra o imunizante, erguida por informações falsas, foi um dos fatores mais cruéis, que levou o país à perda de mais de 800 mil brasileiros na pandemia. Em grande parte, a responsabilidade pela desinformação, obviamente, é das big techs, que obtiveram lucros extraordinários com a monetização da proliferação de informações falsas.
O ambiente de ódio nas redes sociais, associado à disseminação do porte de armas no Brasil, encontrou lugar nas plataformas, multiplicando os índices de violência, de ataques bárbaros às crianças nas escolas, aumento dos casos de feminicídio, de suicídio e de conflitos generalizados na sociedade.
A difusão do neonazismo, condenado por todos os países, em algumas nações considerado crime, também encontrou lugar nas plataformas digitais, com apologia explícita e incitação direcionada a jovens nas redes sociais. Segundo a antropóloga Adriana Dias, professora e pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas, em três anos, houve um crescimento de 270%, de grupos neonazistas no Brasil, com expansão para as cinco regiões do país. Já são mais de 530 núcleos extremistas, com mais de 10 mil pessoas, que se comunicam pelas redes sociais fazendo apologia ao nazismo.
A União Europeia já aprovou lei que responsabiliza as big techs pela veiculação de conteúdo, instituindo o dever de cuidado. Baseado na lei da Alemanha, considerada uma lei severa. Austrália, Canadá, Estados Unidos, entre outros países, também seguem o mesmo caminho, debatendo e votando leis que possam proteger a sociedade e preservar a democracia, assegurando o direito à informação correta e o dever das empresas de respeitar esse direito fundamental.
Não é razoável a veiculação de conteúdos musicais, audiovisuais e jornalísticos, nas redes, sem a devida remuneração pelas plataformas. Se são todos meios, os conteúdos terão que ser pagos. A negação do pagamento explica, em grande parte, os bilionários lucros das big techs.
O assédio do lobby das plataformas digitais a parlamentares, pela rejeição do projeto de lei, é inaceitável. Assim como é inaceitável a campanha abusiva das plataformas digitais contra o projeto de lei, com uso de fake news, qualificando o como censura e bloqueando os conteúdos de apoio à lei nas redes sociais. As ilegalidades na atuação empresarial, no abuso do seu domínio econômico, estão sendo enfrentadas em todo o mundo, pelas ameaças que representam à democracia, ao processo civilizatório e ao Estado Democrático de Direito.
Se as autoridades representativas da sociedade não enfrentarem essa ameaça, o mundo pode caminhar para o caos na comunicação, movido por interesses exclusivamente privados das big techs bilionárias, enquanto seus donos, indiferentes, miram nos painéis das bolsas seus polpudos lucros.
José Guimarães é deputado federal (PT-CE), líder do governo na Câmara e advogado
Artigo publicado originalmente na Carta Capital