‘Salvo-conduto ao golpismo’, diz Chico Alencar sobre PL que pode barrar ação contra Bolsonaro

0
3


ouça este conteúdo

00:00 / 00:00

1x

Por Gabriel Gomes

Em rápida votação, a Câmara dos Deputados aprovou, na calada da noite desta quarta-feira (7), um projeto que suspende a ação penal contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), com brecha para tentar atingir todo o processo relativo à trama golpista de 2022. A medida pode beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), réu no Supremo Tribunal Federal (STF) pela tentativa de golpe.

Da forma como foi aprovado o relatório do deputado bolsonarista Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), o texto está abrangente e suspende a ação por completo. No entendimento do STF, o instrumento deve ficar restrito aos atos cometidos pelo parlamentar após sua diplomação. No plenário da Casa, o projeto teve o apoio de 315 deputados, e 143 foram contra.

Na sessão que aprovou o projeto, o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ), uma das vozes que se opunha à articulação da extrema direita, fez duras críticas à condução do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). “É o gene do Lira que voltou? Hugo você está se rebaixando, herdando o DNA do seu patrão”, disse. Na votação, Motta optou por um rito acelerado e não permitiu emendas ao projeto, por exemplo.

O ICL Notícias conversou com Chico Alencar sobre a aprovação na noite desta quarta e a mobilização para combater e tentar reverter o avanço da medida. Segundo ele, o projeto cria um “salvo conduto para o golpismo”.

deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ)

Deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ). (Foto: Bruno Spada / Câmara dos Deputados)

“Cria uma espécie de salvo-conduto para o golpismo e fragiliza ainda mais a já frágil democracia brasileira. Autoriza novas iniciativas golpistas, está dizendo que o processo eleitoral, se for desagrado de alguma força política, pode ser contestado não apenas no Tribunal Superior Eleitoral, mas através de tramas, ações, acampamentos e atentados e invasão dos poderes”, avaliou o deputado.

Descrente quanto a uma mobilização popular contra o projeto, Chico Alencar acredita que o STF seja a principal via para tentar barrar a medida. “A nossa única esperança agora é o próprio Supremo, que é o intérprete da lei, o guardião da Constituição, barrar essa espécie de anistia temporária, ou fazer a leitura de que ela se refere exclusivamente ao deputado Ramagem”.

Leia a entrevista com o deputado Chico Alencar

ICL Notícias — Qual é a responsabilidade do presidente da Câmara, Hugo Motta, na aprovação do projeto e na forma que a votação foi conduzida?

Chico Alencar — É imensa, eu equiparo à responsabilidade do relator, que fez um projeto de resolução aberto para a possibilidade de trancar a ação penal contra, não apenas o Ramagem, mas 33 outros denunciados ou indiciados, ou réus, como o próprio Ramagem. O Ramagem virou uma espécie de biombo, de guarda-chuva, para fustigar o STF a fim de trancar a ação penal dessa cúpula golpista.

Isso é inconstitucional flagrantemente, porque no artigo 53 da Constituição fala que o Supremo, em caso de ação penal contra parlamentar, deve comunicar às respectivas casas sobre essa ação que, por iniciativa de partido político, podem avaliar a suspensão da ação penal. Foi o que aconteceu, o PL recorreu em relação ao Ramagem, e isso está na Constituição. Tudo na Constituição fala de deputados e senadores. O relator deu o pulo do gato na resolução falando só da ação penal em geral, não especifica, não fala do parlamentar. Apesar de o ministro Zanin ter mandado um ofício onde ele diz que se refere exclusivamente ao Ramagem, ninguém considerou isso.

E o Hugo Motta nessa história? A toque de caixa, fez um rito sumário, impedindo, inclusive, os deputados e deputadas de discutirem o assunto, uma coisa jamais vista, foi uma medida autocrática, vertical, de silenciamento dos parlamentares. O que houve foi orientação de bancada e o uso de tempo de líder, para quem tivesse. Foi um rito sumário autoritário e, logo que acabou a votação, ele já homologou para satisfazer os que querem a anistia. Foi muito ruim o processo, eu fiquei muito indignado, eu e muitos de nós. Tirou do parlamento a sua essência, que é a possibilidade do dissenso civilizado, de você argumentar, não pôde, foi um rito sumaríssimo para provar esse monstrengo inconstitucional.

Qual é a gravidade da aprovação desse projeto?

Cria uma espécie de salvo-conduto para o golpismo e fragiliza ainda mais a já frágil democracia brasileira. Autoriza novas iniciativas golpistas, está dizendo que o processo eleitoral, se for desagrado de alguma força política, pode ser contestado não apenas no Tribunal Superior Eleitoral, mas através de tramas, ações, acampamentos e atentados e invasão dos poderes. É uma vergonha total.

O que a aprovação representa para a imagem da Câmara?

É péssima porque mostra que tem um poder vertical que desmancha todo o pluralismo, a própria representação popular. Se um grupo quer a presidência e age nesse sentido, pode calar vozes dentro do próprio parlamento, uma espécie de autocensura imposta. Foi o que aconteceu ontem.

Você acredita que deve ocorrer uma mobilização popular pra pressionar a câmara a mudar de posição?

Não acredito, infelizmente. A população olha a Câmara já meio de banda, muito distante, não está muito interessada, ainda mais quando a gente, na véspera, aprova por maioria, não por unanimidade, o aumento do número de deputados, sem previsão orçamentária e sem critérios. Nós estamos muito em má conta. Eu vejo aqui nas redes sociais, em função de ontem, ‘o que é que pode se esperar dessa câmara’? Isso tá acompanhando de uma atitude de desprezo, sim, mas também de desinteresse e consequente desmobilização.

A nossa única esperança agora é o próprio Supremo, que é o intérprete da lei, o guardião da Constituição, barrar essa espécie de anistia temporária, ou fazer a leitura de que ela se refere exclusivamente ao deputado Ramagem.

Por parte de vocês, vai haver algum tipo de convocação, ou vocês vão tentar barrar esse projeto exclusivamente pelo Supremo? 

Nós já vamos entrar no Supremo e temos diversas instâncias onde a gente vai fazer essa batalha, mostrar o que aconteceu, mas ainda não reunimos os partidos para pensar em uma mobilização de rua, embora a gente saiba que qualquer proposta para ganhar força dentro dos palácios precisa ter o grito das praças para reforçá-la. Mas, ainda não combinamos nada. Confesso que ficamos surpresos com a celeridade da proposta e com a sua desfaçatez.



Fonte: ICL Notícias

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui