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Lideranças indígenas participam da posse da ministra Rosa Weber como presidente do STF

Alenir Ximenes, Neusa Kunhã Takua e David Popygua foram convidados pelo gabinete da ministra para a cerimônia, que ocorre na tarde desta segunda-feira (12) 

 

Três lideranças indígenas foram convidadas para participar da cerimônia de posse da ministra Rosa Weber como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília. O convite foi feito pelo gabinete da ministra às lideranças Alenir Aquines Ximenes, do povo Guarani Kaiowá, Neusa Kunhã Takua, do povo Guarani Nhandeva, e David Popygua, do povo Guarani Mbya, após visita dos indígenas aos gabinetes dos ministros. A cerimônia ocorre a partir das 17h desta segunda-feira (12), na sede do Supremo, em Brasília.

Ao todo, 1.300 pessoas foram convidadas para a solenidade, na qual a ministra Rosa Weber será empossada como presidente da Suprema Corte e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e o ministro Luís Roberto Barroso assumirá o cargo de vice-presidente do STF.

A Guarani Kaiowá Alenir Aquines Ximenes, liderança da Terra Indígena (TI) Nhanderu Marangatu, no Mato Grosso do Sul, considera que a presença indígena na cerimônia é um “momento histórico”.

“Estou aqui representando o Mato Grosso do Sul na posse da Rosa Weber. É muito importante para nós o STF, pois ali está a base para cumprirem nossos direitos e derrubar o marco temporal. Neste momento, é muito importante a entrada dela e a nossa presença, porque é um momento histórico”, afirma Alenir.

Neusa Kunhã Takua, vice-cacique da TI Tekoha Jehy (Rio Pequeno), em Paraty (RJ), afirma que o momento representa também a esperança de que os direitos constitucionais indígenas sejam garantidos.

“É uma honra poder estar aqui representando a população indígena, é a primeira vez da população indígena dentro dessa cerimônia. É muito importante, e a gente vem com essa esperança, de que nossas leis sejam de fato respeitadas, nossa Constituição Federal”, avalia a liderança Guarani Nhandeva.

Para David Popygua, cacique da aldeia Tekoá Itu, na TI Jaraguá, em São Paulo, a participação das lideranças indígenas na solenidade é ainda mais significativa no atual contexto político do Brasil, em que os direitos dos povos originários vêm sendo duramente atacadas por projetos legislativos que tramitam no Congresso Nacional e por medidas do governo federal.

“Estamos muito felizes com esse convite para participar deste momento tão importante para o Brasil, e estamos aqui para mostrar que nós, indígenas, estamos vivos, lutando e resistindo a todo esse cenário que foi causado, esse grande desastre desse governo que está nos exterminando e atacando nossos direitos”, avalia o líder Guarani Mbya.
A presença de indígenas na cerimônia de posse de uma presidente do STF é carregada de simbolismo e ineditismo, explica Paloma Gomes, assessora jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Antes da posse de Rosa Weber, a única vez em que indígenas foram convidados para a posse de um presidente da Suprema Corte foi em 2018, quando a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) foi convidada para a cerimônia de empossamento do ministro Dias Toffoli como presidente.

“Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 até agora, em 34 anos, esta é a vigésima presidência do STF e apenas a segunda vez em que lideranças ou representantes dos povos indígenas foram convidados a participar da posse de um ministro do Supremo como presidente da Corte. É muito simbólico isso”, avalia a assessora.

Mesmo após a redemocratização e a promulgação da Constituição Federal de 1988, que dedica um capítulo inteiro “aos índios”, os povos indígenas demoraram até mesmo a serem mencionados nos discursos de posse de presidentes da Suprema Corte.

“A primeira menção a povos e nações em um discurso de posse de presidente do STF ocorreu somente dez anos após a promulgação da Constituição. O termo indígena veio a ocupar os dizeres de um novo presidente empossado somente em 2008, ou seja, vinte anos após a Carta constitucional”, aponta Paloma.

“Isso mostra que, apesar da ideia de um país plural, que possui diversas nações indígenas, diversos povos e comunidades tradicionais, como os quilombolas, essa diversidade nunca esteve representada num discurso de posse e muito menos em um  convite de participação dessas coletividades a uma solenidade como essa”, prossegue.

O convite às lideranças para a cerimônia sinaliza, por isso, um aceno e uma abertura aos povos e sua luta pela garantia dos direitos que já foram reconhecidos pela Constituição – como o direito originário às suas terras, o direito a viver de acordo com seus próprios modos de vida e formas de organização social e, ainda, o direito de acesso à justiça.

“Isso simboliza que aos poucos o Supremo está se abrindo à matéria indígena e entendendo a importância da participação dos povos indígenas no acesso ao poder Judiciário”, analisa a advogada.

Repercussão geral e marco temporal

As lideranças convidadas para a posse também aproveitam o momento para marcar a posição dos povos indígenas contra a tese ruralista do chamado “marco temporal”, e pedir ao STF que conclua o julgamento sobre o tema.

Com repercussão geral reconhecida pela Corte, o processo que envolve o território do povo Xokleng, em Santa Catarina, servirá de referência para todos os casos envolvendo a demarcação de terras indígenas – e, portanto, terá consequências para todos os povos originários do Brasil.

“O Judiciário, o STF tem um papel fundamental de nos proteger. Nossos territórios estão sendo invadidos, o marco temporal precisa ser rapidamente julgado e anulado. O Supremo precisa pôr um fim ao marco temporal. Por conta do marco temporal estar tramitando no Supremo, as terras indígenas estão sendo atacadas, e o governo federal tem se aproveitado dessa situação para não defender os territórios indígenas”, aponta David Popygua.

Paralisado desde setembro de 2021, depois de um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, o processo representa a esperança dos povos indígenas de que o Supremo reafirme seus direitos constitucionais, diga não à tese do marco temporal e afaste, com isso, as ameaças de despejo, violência e desterritorialização que rondam várias comunidades indígenas – assim como a realidade enfrentada hoje por povos em muitas regiões do país de conflitos, fome e vulnerabilidade social.

“Nossos territórios estão completamente ameaçados e a violência contra nosso povo tem aumentado muito”, relata David. “Então, fica aqui o nosso apelo e a nossa oportunidade de estar nessa sessão de posse é muito importante. A ministra já está sinalizando que respeita os povos indígenas com esse convite”.

Os povos indígenas têm reivindicado que o julgamento seja retomado e concluído o quanto antes pelo STF. O processo chegou a ser incluído na pauta do Supremo do primeiro semestre de 2022, mas acabou sendo retirado, e até o momento não teve seu julgamento remarcado.

“Vamos lá, demonstrar que nós indígenas estamos muito preocupados e contamos muito com o Supremo para que protejam nossos direitos, garantam que nossos territórios sejam protegidos e não deixem que esse governo siga avançando sobre nossos territórios com essa política anti-indígena que está em curso”, afirma David Popygua.

“A luta dos povos indígenas é para acabar com o marco temporal, que mata e está matando os povos indígenas. Nossa presença é a luta pelo nosso território. Queremos cada vez mais ter acesso, vir a Brasília, no Congresso, nossa voz, nossa luta, e derrubar todas essas leis que atacam e matam os povos indígenas”, diz Neusa Kunha Takua.

Mobilização em Brasília

Além das três lideranças presentes na posse de Rosa Weber, cerca de 120 indígenas dos estados de Maranhão, Bahia, Roraima e Minas Gerais estão presentes na capital federal e realizarão mobilizações e incidências em defesa de seus direitos ao longo da semana.

Participam da mobilização em Brasília lideranças dos povos Apãnjekra Canela, Memortumré Canela, Akroá Gamella, Tremembé do Engenho e Kari’u Kariri, do Maranhão, Macuxi, de Roraima, Pataxó, da Bahia, e Xakriabá, de Minas Gerais.

A posse terá transição ao vivo pela TV Justiça.

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