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Por Cézar Feitoza e Ana Pompeu
(Folhapress) – O ex-ministro da AGU (Advocacia-Geral da União) Bruno Bianco disse nesta quinta-feira (29) ao STF (Supremo Tribunal Federal) que o ex-presidente Jair Bolsonaro perguntou a ele se haveria meios jurídicos para questionar o resultado das eleições de 2022. O encontro teria ocorrido na presença dos comandantes das Forças Armadas.
A defesa do ex-ministro Anderson Torres incluiu ex-ministros de seu governo para prestar depoimentos como testemunhas no processo em que o político é réu sob a acusação de crimes contra o Estado.
“O presidente da República foi específico sobre como havia ocorrido o pleito eleitoral, me perguntou se havia problema jurídico, se vislumbrava algum problema ou algo que pudesse ser questionado. Eu disse que foi absolutamente transparente e essas foram as minhas considerações, e o presidente, pelo menos na minha frente, se deu por satisfeito”, disse Bianco.
Ainda de acordo com o relato dele, Bolsonaro o chamou no Palácio do Planalto e a conversa teria sido rápida. “Salvo melhor juízo estava no palácio (…), mas o presidente me perguntou até em pé e foi uma interação bastante breve. Eu até pensei que estávamos para falar de transição”, afirmou Bianco.
Bruno Bianco chefiou a AGU de agosto de 2021 a dezembro de 2022. No governo, ele foi também secretário especial adjunto de Previdência e Trabalho da Economia, secretário especial da Economia, e, por alguns dias, secretário-executivo do Ministério da Previdência.
Testemunhas ausentes
A audiência no Supremo nesta quinta-feira (29) previa a participação dos ex-ministro Bruno Bianco (AGU), Paulo Guedes (Economia), Celio Faria (Secretaria de Governo), Wagner Rosário (CGU) e Adolfo Sachsida (Minas e Energia). O ex-número dois da Advocacia-Geral da União Adler Anaximandro Cruz e Alves também prestaria depoimento.
Guedes, Celio e Adler, porém, faltaram à audiência. A defesa de Anderson Torres desistiu do depoimento dos ex-ministros.
Os integrantes do governo Bolsonaro foram chamados a depor especialmente para contestar a versão da PGR (Procuradoria-Geral da República) de que uma reunião de julho de 2022 discutia cenários golpistas.
A gravação da reunião foi encontrada pela Polícia Federal entre os arquivos digitais mantidos com o tenente-coronel Mauro Cid.
O vídeo mostra o momento em que Anderson Torres recebe a palavra após Bolsonaro levantar discussões golpistas. “E o exemplo da Bolívia é o grande exemplo pra todos nós. Senhores, todos vão se foder! Eu quero deixar bem claro isso”, disse Torres.
Ex-ministro da CGU
O ex-ministro da CGU Wagner Rosário falou por cerca de dez minutos ao Supremo. Ele só foi questionado pela defesa de Torres, com o foco na reunião ministerial de julho de 2022.
Segundo o ministro, o tema principal da reunião foi a discussão de como as instituições deveriam agir diante da aproximação do processo eleitoral. Wagner disse que o objetivo era encontrar possíveis fragilidades nas urnas eletrônicas e saná-las.
Nenhum indício de fraude foi identificado pelas entidades fiscalizadoras, que tiveram 12 meses para realizar auditorias no código-fonte do sistema eleitoral e acompanharam todos os processos relacionados à lacração das urnas e a realização do pleito.
“Algumas instituições eram entidades fiscalizadoras do processo eleitoral, e foram discutidas situações de problemas que poderiam haver nesses sistemas e como as instituições poderiam atuar”, disse.
Bianco afirmou não se lembrar com exatidão dos temas discutidos no encontro. Ele disse que foi convocado para a reunião para falar sobre a cartilha tradicionalmente produzida pela AGU sobre as condutas proibidas para agentes públicos durante o processo eleitoral.
Ele disse, porém, que a reunião não teve teor golpista. “A gente estava em período pré-eleitoral, havia disputa acirrada. Havia posicionamento sobre quais as posturas eram proibidas no período eleitoral, mas não vi qualquer tipo de questão que indicasse ruptura”, avaliou.
Antes de falar sobre a reunião com Bolsonaro, Bianco foi questionado se alguns dos envolvidos em investigações criminais conduzidas no âmbito do STF o procuraram durante o governo para saber da legalidade de eventuais medidas tomadas contra integrantes, o que ele negou.
“As consultas são absolutamente formais. A Advocacia Geral da União é um órgão institucional com atribuições específicas na Constituição. Todas as consultas que foram feitas são públicas. Não houve consulta relativa a questões pessoais”, respondeu.
A AGU também tem como atribuição representar autoridades. Assim, de acordo com ele, não raras vezes autoridades submetidas a qualquer tipo de processo poderiam se valer do órgão.

Ex-ministro da Justiça Anderson Torres (Tom Molina/Reuters)
“A Advocacia Geral da União fazia um crivo com total governança e isso nem chega no advogado-geral. E aí as instâncias inferiores decidem se defendem ou não. Mas não há consulta nenhuma nesse sentido”, disse.
O Supremo entra nesta quinta-feira no nono dia de audiências para ouvir as testemunhas do processo sobre a tentativa de golpe de Estado. O tribunal tem reservado mais dois dias para os depoimentos.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e o ex-ministro e senado Ciro Nogueira (PP-PI) estão entre as testemunhas arroladas para prestar depoimento na sexta-feira (30). O general Gustavo Dutra, ex-comandante militar do Planalto, deve ser intimado pelo Supremo para falar na segunda-feira (2).
Na Presidência, Bolsonaro acumulou uma série de declarações golpistas às claras, provocou crises entre os Poderes, colocou em xeque a realização das eleições de 2022, ameaçou não cumprir decisões do STF e estimulou com mentiras e ilações uma campanha para desacreditar o sistema eleitoral do país.
Após a derrota para Lula, incentivou a criação e a manutenção dos acampamentos golpistas que se alastraram pelo país e deram origem aos ataques do 8 de Janeiro.
Nesse mesmo período, adotou conduta que contribuiu para manter seus apoiadores esperançosos de que permaneceria no poder e, como ele mesmo admitiu publicamente, reuniu-se com militares e assessores próximos para discutir formas de intervir no TSE e anular as eleições.
Saudosista da ditadura militar (1964-1985) e de seus métodos antidemocráticos e de tortura, o ex-presidente já foi condenado pelo TSE por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral e é réu no STF sob a acusação de ter liderado a trama golpista de 2022. Hoje está inelegível ao menos até 2030.
Caso seja condenado pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado, a pena pode passar de 40 anos de prisão.
Fonte: ICL Notícias
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