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Castanha do Brasil. Estímulo à economia e conservação da Amazônia

Republicado de  AMAZONIA.ORG.BR

Além de fomentar a economia regional, produto ajuda no desenvolvimento sustentável do ecossistema. Castanha ocupa segundo lugar do ranking dos produtos não madeireiros mais extraídos da região Norte, aponta IBGE.

É por volta das 6h30 que o extrativista Natanael Gonçalves Vicente, de 46 anos, segue de motocicleta até a mata para coletar castanha todos os dias. O percurso de pelo menos dez quilômetros aos castanhais é feito dentro da reserva do rio Cajari, no Amapá, onde vivem mais de 300 famílias. Retorna apenas entre 16h e 17h junto de dois dos seus quatro filhos que dão suporte ao trabalho, de 18 e 22 anos.

Natanael cumpre a rotina de coleta desde a adolescência e a castanha é a principal fonte de renda da família do extrativista. “Comecei com meu pai muito cedo ainda a trabalhar. É uma tradição que veio do meu avô, que passou para o meu pai e agora veio para mim”, disse.

“Quando chega a época da castanha, é a época em que os extrativistas conseguem um recurso financeiro com mais rapidez. A agricultura familiar que a gente trabalha é para subsistência”, complementou o extrativista.

A importância da castanha para a Amazônia vai além. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o fruto ocupa o segundo lugar do ranking dos produtos não madeireiros mais extraídos na Região Norte, perdendo apenas para o açaí.

Em 2019, mais de 32 mil toneladas de castanha foram comercializadas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Dessa quantidade, 7 mil (21,8%) foram destinados ao mercado externo.

Assim como na família de Natanael, a coleta da castanha-da-amazônia é tradição no povo Paiter Suruí. Os indígenas, porém, estão entre os muitos do bioma brasileiro que são ameaçados por invasões de madeireiros e, consequentemente, com o avanço do desmatamento.

A terra indígena onde vivem os Paiter, a Sete de Setembro, fica ao norte de Cacoal (RO) e tem quase 1,4 mil indígenas, de acordo com o Instituto Socioambiental (ISA).

Trabalhar com castanha é tradição do povo indígena Paiter Suruí. — Foto: Ubiratan Suruí/Arquivo pessoal
Trabalhar com castanha é tradição do povo indígena Paiter Suruí. — Foto: Ubiratan Suruí/Arquivo pessoal

“100% do povo Paiter trabalha com o extrativismo de castanha. O que mais precisamos é de um mercado certo para colocarmos o nosso produto. É importante porque gera uma renda para a própria família e é usada para o próprio consumo. As famílias saem de suas aldeias e vão para a floresta. Coletam, trazem, lavam, secam, colocam na sacola e levam para venda. Realmente existe uma cadeia”, ressaltou Rubens Suruí, coordenador da Associação Metareilá do Povo Indígena Suruí.

Para Rubens, a atividade econômica gerada pela castanha-da-amazônia ajuda a frear tais invasões e, assim, protege e conserva a floresta. Com a presença dos indígenas nos castanhais na época de coleta, por exemplo, os invasores acabam se escondendo, o que inibe as atividades ilícitas na reserva.

“Ela (castanha) ajuda para que não aconteça esse desmatamento e essa ilegalidade dentro do território. Trabalhar com a castanha é como se fosse cuidar da floresta”, declarou.

A agricultura itinerante, prática indígena que existe há milhares de anos na Amazônia, também auxilia na renovação do ambiente florestal por meio dos castanhais. O trabalho consiste em derrubar trechos das florestas e depois fazer a limpeza dos resíduos do corte. A ideia é preparar a área para cultivo e tornar o terreno até mais fértil.

“(Os indígenas) cortam uma vegetação de uma área, queimam, plantam ali por um ou dois ciclos, depois abandonam aquela área e vão fazer a roça em uma outro terreno. E aquela área volta a virar capoeira e floresta, que é o que chamamos de sucessão vegetal. E por 7, 8 anos já está praticamente uma floresta de novo”, complementou Marcelino Guedes, especialista em Castanha do Brasil pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) do Amapá.

Castanheira. — Foto: Marcelino Guedes/Arquivo pessoal
Castanheira. — Foto: Marcelino Guedes/Arquivo pessoal

Um segundo contribuinte da fauna e flora local é a cutia, mamífero roedor de pequeno porte que consegue retirar as sementes do ouriço – que pode ter entre 12 e 16 frutos, a depender do tamanho.

Depois que se alimenta até se saciar, o animal enterra algumas sementes para comer, mas acaba esquecendo onde guardou algumas delas. Segundo Marcelino, com esse processo, o mamífero mantém viva a cadeia do fruto.

“(A cutia) acaba levando vários ouriços e plantando muito mais sementes nesse tipo de ambiente, que são as roças e as capoeiras abandonadas. Ela faz a verdadeira plantadura das castanheiras. Consequentemente se tem um processo de renovação dos castanhais que está sendo favorecido pela prática agrícola”, disse.

Espécime de cutia ('Dasyprocta-sp') que vive na floresta amazônica. — Foto: Divulgação/André Botelho
Espécime de cutia (‘Dasyprocta-sp’) que vive na floresta amazônica. — Foto: Divulgação/André Botelho

Potencial de mercado

Para o analista de mercado da Conab Humberto Pennacchio, a castanha da Amazônia tem grande potencial para aumentar as vendas nacionais e até internacionais. Porém, o baixo preço de comercialização continua sendo um empecilho entre o extrativista e o mercado.

A safra 2021 recomeça neste mês de janeiro e se estende por um período de pelo menos dois meses, podendo chegar até três dependendo da região. A castanheira começa a dispersar os ouriços em meados de dezembro, época de chuva. Nos meses seguintes, os frutos caem.

Assim que todos os ouriços estão no chão começa a coleta, que pode se estender até abril. A renda varia de R$6 mil a R$8 mil, com uma produção média de 60 barrigas de castanha por família.

“No extrativismo nós temos a questão do preço. Quando o preço se torna atrativo, evidentemente que vou produzir mais, vou me esforçar mais para ter uma maior oferta desse produto. No caso da castanha não é diferente”, reforçou Pennacchio.

“Essa época que nós temos agora é de precificação em toda a região. É quando os compradores tentam estabelecer ou estabelecem um acordo junto ao extrativista para poder precificar esse produto e buscá-lo. O extrativista, logicamente, só vai buscar o produto se for rentável a ele. Tem que ter um preço remunerador”, explicou o analista.

E como forma de ajudar os extrativistas e indígenas a aumentar a coleta, empresas têm apostado no recolhimento de dados por meio do método de biomonitoramento, que ajuda a mensurar a qualidade do ambiente com base nas alterações que a área já sofreu.

“Com as informações geradas, os extrativistas conseguem observar onde está o maior custo da produção da castanha, que hoje é um dos carros-chefes das reservas extrativistas. A produção de castanha é altíssima na Amazônia inteira. E o legal desses protocolos locais é que ele pode ser adaptado para qualquer lugar”, disse Paulo Henrique Bonavigo, presidente da Ação Ecológica Guaporé (Ecoporé) e pesquisador do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ).
Castanha-da-amazônia — Foto: Reprodução/Rede Amazônica

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