O governo brasileiro se articula para reagir ao famigerado “Dia da Libertação”, nesta quarta-feira (2), quando entra em vigor o plano de tarifas recíprocas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. As sobretaxas devem atingir produtos brasileiros comprados pelos EUA, como aço e etanol.
O governo norte-americano deve anunciar amanhã as novas taxas, mas a implementação só deve ocorrer mais adiante.
Na segunda-feira (31), estava agendada uma conversa entre o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, e o representante comercial dos Estados Unidos, Jamieson Greer. Porém, a conversa acabou sendo cancelada devido ao desencontro das agendas de ambos.
Em outra frente, a CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado Federal aprovou, nesta terça-feira (1º), um projeto que cria a Lei da Reciprocidade Econômica, um conjunto de medidas que visa a retaliar a política tarifária do presidente dos Estados Unidos.
Por ora, o que se especula é que Trump deve anunciar amanhã as novas tarifas de importação país por país, que poderão ir de 10% a 25%, e o Brasil articula meios de reduzir os impactos do tarifaço aos setores econômicos.
A diplomacia brasileira trabalha para mostrar que o Brasil está aberto ao diálogo. O governo brasileiro fortaleceu todos os canais de negociação com os Estados Unidos. O principal argumento dos negociadores brasileiros é que o Brasil não é o problema para os Estados Unidos. Afinal, há anos a balança comercial entre os dois países é superavitária em favor dos Estados Unidos.
O governo Trump anunciou a lista dos que chamam de os “15 sujos”, os países com maior superávit com os Estados Unidos. O Brasil está mostrando que não está nesse grupo.
Contudo, quando anunciou as tarifas recíprocas, em fevereiro, Trump citou, por exemplo, o etanol brasileiro. “A tarifa dos EUA sobre o etanol é de apenas 2,5%. No entanto, o Brasil cobra uma tarifa de 18% sobre as exportações de etanol dos EUA. Como resultado, em 2024, os EUA importaram mais de US$ 200 milhões em etanol do Brasil, enquanto exportaram apenas US$ 52 milhões em etanol para o Brasil”, diz trecho do texto.
Assim que as medidas foram anunciadas, o setor de etanol lamentou a decisão do governo estadunidense, dizendo que corresponde a um retrocesso.
Trump chamou a data de amanhã de “Dia da Libertação” porque, segundo ele, esse será o dia que o conjunto de taxas libertará os EUA de produtos estrangeiros.
Brasil é destaque em relatório sobre tarifas recíprocas
Apesar de todas as justificativas do governo brasileiro, um relatório feito pelo Escritório do Representante Comercial dos EUA (USTR), comandado por Jamieson Greer, sobre barreiras comerciais ao redor do mundo, destacou políticas consideradas protecionistas que prejudicariam exportadores norte-americanos. Isso daria “justificativa” para aplicar o tarifaço.
O documento destaca supostas barreiras comerciais do Brasil, que é o sétimo com mais páginas dedicadas no relatório (cinco) e sétimo com maior impacto econômicos estimado aos EUA (US$ 8 bilhões).
Dentre as supostas barreiras brasileiras apontadas pelos EUA estão tarifas elevadas, restrições a remanufaturados, barreiras técnicas e sanitárias e incentivos a conteúdo nacional em compras governamentais.
Haddad critica tarifaço; Amorim diz que país responderá “sem dar tiro no pé”
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, criticou na segunda-feira (31) o anúncio do plano de tarifas recíprocas de Donald Trump, embora ressaltando que a parceria econômica deve prevalecer.
“Qualquer retaliação ao Brasil vai soar injustificável à luz dos dados e à luz das décadas de parceria entre Estados Unidos e Brasil”, afirmou Haddad.
Por sua vez, o assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, afirmou que o Brasil está preparado para reagir ao novo tarifaço, mas sem adotar medidas que possam comprometer a economia.
Em entrevista ao jornal Valor Econômico, publicada nesta terça-feira (1º), Amorim disse que o governo brasileiro prefere negociar, mas já intui onde poderá agir caso a tentativa de diálogo não prospere.
“Não adianta tomar uma contramedida que seja um ‘tiro no pé’. Mas tem medidas que afetam eles [os EUA]”, declarou Amorim, ao explicar que o país está atento às opções disponíveis.
O ex-chanceler citou como exemplo a retaliação cruzada utilizada pelo Brasil no contencioso do algodão na OMC (Organização Mundial do Comércio), quando os EUA foram atingidos na área de propriedade intelectual. “O direito de legítima defesa é sagrado na política internacional”, reforçou.
Para Amorim, o novo movimento de Trump na arena comercial aumenta o risco de o mundo ser dividido em grandes zonas de influência entre Estados Unidos, China e Rússia. “Temos que contrabalançar uma certa tendência que a gente vê de querer dividir o mundo muito claramente em regiões com áreas de influência. Temos que trabalhar no mundo verdadeiramente multipolar”, afirmou.
Fonte: ICL Notícias