Muitos amazonenses não sabem o tamanho de Thiago de Mello. Ele é grande, gigante, imenso. Talvez, quase certeza, o nome amazonense de maior prestígio no Brasil e no mundo.
Saiba um pouco mais desse amazonense, genuinamente caboclo, que encantou o BRASIL e o MUNDO.
Amadeu Thiago de Mello nascido no município de Barreirinha em 31 de março de 1926, é um poeta e tradutor brasileiro.
É considerado um dos poetas mais influentes e respeitados no país, reconhecido como um ícone da literatura regional.
Tem obras traduzidas para mais de trinta idiomas. Preso durante a ditadura (1964-1985), exilou-se no Chile, encontrando em Pablo Neruda um amigo e colaborador.
No exílio, morou na Argentina, Chile, Portugal, França, Alemanha. Com o fim do regime militar, voltou à sua cidade natal, depois mudou-se para Manaus, onde viveu até sua morte.
Seu poema mais conhecido é Os Estatutos do Homem, onde o poeta chama a atenção do leitor para os valores simples da natureza humana. A sua poesia escrita foi Poesia Comprometida com a Minha e a Tua Vida que rendeu-lhe, em 1975, ainda durante o regime militar, um prêmio concedido pela Associação Paulista dos Críticos de Arte e tornou-o conhecido internacionalmente como um intelectual engajado na luta pelos Direitos Humanos.
Em homenagem aos seus 80 anos, completados em 2006, foi lançado pela Karmim o CD comemorativo A Criação do Mundo, contendo poemas que o autor produziu nos últimos 56 anos, declamados por ele próprio e musicados por seu irmão mais novo, Gaudêncio.
Obras
Poesia
Silêncio e Palavra, 1951
Narciso Cego, 1952
A Lenda da Rosa, 1956
Faz Escuro, mas eu Canto: porque a manhã vai chegar, 1966
Poesia comprometida com a minha e a tua vida, 1975
Os Estatutos do Homem, 1964
Horóscopo para os que estão Vivos, 1984
Mormaço na Floresta, 1984
Vento Geral – Poesia, 1981
Num Campo de Margaridas, 1986
De uma Vez por Todas, 1996
Cantídio, André Provérbios, 1999
Prosa
A Estrela da Manhã, 1968
Arte e Ciência de Empinar Papagaio, 1983
Manaus, Amor e Memória, 1984
Amazonas, Pátria da Água, 1991
Amazônia — A Menina dos Olhos do Mundo, 1992
O Povo sabe o que Diz, 1993
Borges na Luz de Borges, 1993
Vamos Festejar de Novo, 2000
———————-
O Globo.com.br
Um de seus poemas mais famosos é “Os estatutos do homem (Ato Institucional Permanente)”. Escrito após o golpe de 1964, esse poema, OS ESTATUTOS DO HOMEM, é uma resposta ao mesmo tempo singela e poderosa ao Ato Constitucional I.
O decreto tinha como objetivo afastar qualquer forma de oposição e legitimar o regime, possibilitando a cassação de mandatos legislativos, a suspensão de direitos políticos e o afastamento de servidores públicos.
Após o decreto, Mello renunciou ao posto de adido cultural no Chile, cargo que ocupava na época. Ele voltaria ao Brasil para combater a ditadura em 1965, mas acabaria preso logo após descer do avião. Em novembro daquele ano, participou de uma manifestação de intelectuais em frente ao hotel Glória, no Rio, durante a abertura da II Conferência Extraordinária da Organização dos Estados Americanos (OEA), na qual falaria o presidente Castello Branco.
Apesar de ter mobilizado um grupo pequeno, a manifestação atraiu a atenção de repórteres e causou grande repercussão. O episódio levou os militares a fortalecerem o cerco a artistas e intelectuais no país.
O ato, que ficou conhecido como “os oito da Glória”, resultou na prisão de Glauber Rocha, Carlos Heitor Cony e Joaquim Pedro de Andrade, entre outros. Mello escapou, mas acabou se apresentando às autoridades em seguida. Ele foi libertado após um mês.Quatro anos depois, o poeta entrou para a clandestinidade, após seu envolvimento com o Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR). Mais uma vez, exilou-se no Chile, onde ficou até a ascensão de Augusto Pinochet, em 1973. Mello traduziu para o português o Nobel de Literatura Pablo Neruda, com quem conviveu no Chile.
Outro conhecido poema de Mello é “Faz escuro, mas eu canto, / Porque a manhã vai chegar”, publicado em “A madrugada camponesa” (1965). Os versos inspiraram a 34º Bienal de Sâo Paulo, de 2020, que homenageou o poeta.
‘Um dos maiores poetas da nossa história’
Amigo de Mello, o escritor Milton Hatoum descreveu o autor dos “Estatutos do homem” ao GLOBO como alguém “generosos” e “esperançoso” e que, justamente por não temer o regionalismo, tornou-se um poeta universal.
— A obra de Thiago tem duas vertentes, a social e a lírico-amorosa. Ambas são águas de um mesmo grande rio — explica Hatoum. — Ele nunca teve medo de usar expressões muito amazônicas em seus versos, como nomes de pássaros e de frutas. Não tinha medo de ser regionalista. E de fato não era. Conseguiu ser universal porque tinha paixão pelo lugar onde vivia.
Hatoum lembra que Mello foi pioneiro da defesa do meio ambiente e dos povos indígenas e, de cabeça, cita os versos finais do poema “A terra traída”, incluído no livro “Acerto de contas”, de 2015: “quando queimam a mata, enlouquecidos de pavor, os pássaros se esquecem dos seus cantos”. Hatoum destaca “A terra traída” como um dos pontos altos da carreira de Mello, poeta de versos límpidos que dominava como poucos a métrica.
“Acerto de contas” reúne poemas sobre o amor, a natureza e homenagens a amigos de Mello, como os poetas Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Mello Neto, o ambientalista Chico Mendes e a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva. Há também um poema inspirado em “Relato de um certo Oriente”, romance premiado de Hatoum.
— Thiago teve uma trajetória bonita como cidadão e poeta — diz Hatoum, que lembra que, nos últimos anos, Mello andava melancólico com a “barbárie” que tomou conta de Manaus. — Mas o que fica é a gratidão pela amizade dele. As coisas que Thiago mais prezava eram a poesia, a amizade e a natureza.
Engajamento pela Amazônia
Ao longo da carreira, Mello publicou as coletâneas poéticas “Poesia comprometida com a minha e a tua vida” (1975), “Mormaço na floresta” (1984), “Num campo de margaridas” (1986) e “Acerto de contas” (2015), que ele considerava uma espécie de testamento da sua obra. Também é autor dos ensaios “Arte e ciência de empinar papagaio” (1983), “Amazonas, pátria da água” (1990) e “O povo sabe o que diz” (1993), entre outros. Em 2018, ele foi homenageado como Personalidade Literária do Ano pela Câmara Brasileira do Livro (CBL) no Prêmio Jabuti.
Mello morou ainda na Argentina, em Portugal, na França e na Alemanha. Após o exílio na Europa, em 1978, voltou a Barreirinhas, sua cidade natal. Em 2017, o poeta passou a sofrer ameaças de morte de caboclos após denunciar as atividades ilegais da madeireira holandesa EcoBrasil Holanda-Andirá, na localidade. Nos últimos anos, ele vinha enfrentando os sintomas do Alzheimer e outros problemas de saúde.