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Um julgamento em curso no STF (Supremo Tribunal Federal) pode permitir a “pejotização” irrestrita no Brasil, o que significaria precarização do mercado de trabalho, dos direitos dos trabalhadores, além de colocar em risco o futuro da Previdência Social. Se isso acontecer, os danos são muito maiores do que o atual escândalo dos descontos irregulares em aposentadorias e pensões de segurados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), ainda que não se possa minimizar este último – pelo contrário.
Do ponto de vista financeiro e para o arcabouço legal trabalhista do país, o julgamento do STF será extremamente danoso.
Em abril, o ministro do STF Gilmar Mendes suspendeu a tramitação de todos os processos que discutem a licitude da contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços, a chamada “pejotização”. A suspensão ocorre até que o órgão dê uma palavra final sobre o tema, o que ainda não tem data para ocorrer.
Esse tipo de contrato trabalhista começou a ganhar corpo quando a reforma trabalhista foi aprovada, em 2017, no governo do ex-presidente Michel Temer, precarizando as relações trabalhistas no país.
O jurista e professor de direito na USP (Universidade de São Paulo) Jorge Luiz Souto Maior classificou a decisão de Mendes como mais um passo no desmonte dos direitos trabalhistas promovido com maior ênfase desde a reforma trabalhista. “Estamos diante da realidade concreta do fim do direito do trabalho”, afirmou ao Brasil de Fato.
Para efeito de comparação, enquanto os cálculos preliminares do escândalo dos descontos irregulares das aposentadorias e pensões do INSS chega à casa dos R$ 6,3 bilhões no período entre 2019 e 2024, um estudo da FGV (Fundação Getúlio Vargas), publicado no ano passado, calculou uma perda de arrecadação para os cofres públicos de até R$ 144 bilhões, entre 2012 e 2023.
O prejuízo aos cofres públicos ocorreu porque a pejotização recolhe menos impostos do que o contrato via CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). O estudo foi feito a pedido da seccional paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), e publicado em junho de 2024.
Ainda em abril, em parecer enviado ao STF, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional alertou que autorizar a pejotização de trabalhadores pode ter “consequências nefastas” sobre a arrecadação fiscal e o custeio da Previdência.
“Tal artifício aniquilaria o dever que vincula profissionais liberais qualificados ao pagamento de imposto de renda”, frisou a PGFN. “E desfalcaria o caixa da Previdência Social, afastando-se a incidência da contribuição social patronal”, acrescentou o órgão, um dos braços da Advocacia-Geral da União (AGU).
Juízes se manifestam contra a pejotização
A maioria dos ministros do STF vem derrubando, há ao menos dois anos, decisões da Justiça do Trabalho que apontam fraudes, reconhecem o vínculo empregatício e determinam o pagamento de direitos, nos moldes da CLT. Dos 11 ministros do órgão, apenas Edson Fachin e Flávio Dino são apontados como exceções a esse tipo de decisão.
Em 1º de maio, Dia do Trabalhador, entidades representativas de juízes, procuradores e advogados trabalhistas lançaram um manifesto defendendo a competência da Justiça do Trabalho para julgar processos sobre a pejotização. O documento alerta, por exemplo, que a chancela do STF pode não só tornar a CLT letra morta, como também causar impactos profundos para o caixa do Estado.
O mesmo estudo da FGV aponta que o prejuízo seria de R$ 384 bilhões em um ano se metade dos celetistas virassem PJs. Ou seja: se metade dos 35,5 milhões de trabalhadores com carteira assinada no país em 2023 deixassem de ser registrados como empregados CLT e passassem a ser contratados como PJ, a conta chegaria nos R$ 384 bilhões em um único ano.
Estão incluídos no cálculo tributação mais baixa sobre o imposto de renda, além das contribuições não recolhidas ao INSS.
Déficit do INSS para MEIs
Dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostra que, no caso dos trabalhadores com MEIs (Microempreendedores Individuais), o impacto chega a R$ 600 bilhões para o INSS até 2060.
Isso porque, enquanto um empregado com carteira assinada tem desconto de até 14% em seus vencimentos para o INSS, o MEI paga 5% do salário mínimo.
Além disso, só quatro a cada dez microempreendedores estão em dia com a mensalidade, atualmente fixada em R$ 75,90.
Clique aqui para ler o estudo da FGV.
Clique aqui para ver o estudo do Ipea.
Fonte: ICL Notícias