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o drama diário da UFRJ

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Por Gabriel Gomes

Estudante de Geologia, a jovem Mariana Garcia, de 23 anos, convive, desde o início da graduação, com o medo e a insegurança nas viagens que precisa fazer para as aulas de campo (pesquisas in loco)  por conta da precarização dos transportes oferecidos pela faculdade.

Em fevereiro deste ano, ela e outros alunos do curso ficaram parados na beira da estrada por 5 horas após o ônibus da faculdade apresentar defeito. Como acontetecera antes em várias oportunidades, alguns alunos precisaram descer para tentar ajudar no conserto dos veículos.

“Nós ficamos parados na beira da estrada, a 13 horas do Rio de Janeiro, porque deu um problema elétrico no nosso ônibus e ele não voltou a ligar de forma nenhuma. Ao todo, entre espera na estrada e pernoite na cidade, aguardamos por umas 32 horas”, conta. “A gente quer fazer a graduação, mas não quer acabar virando notícia de uma tragédia”.

UFRJ

Estudante precisaram ajudar no conserto de ônibus da UFRJ. (Foto: Arquivo Pessoal)

Em outra viagem recente de alunos do curso de Geologia, o ônibus da universidade desceu toda a Serra das Araras, no interior do Rio de Janeiro, sem freio. “Já aconteceram episódios de alunos precisarem ajudar a trocar pneus e muitos outros problemas”, diz Mariana Garcia.

“A gente não vai para campo por livre escolha, é obrigatório, faz parte da nossa graduação. Fica muito complicado para gente, toda vez que a gente vai para campo, a gente tá em risco”, completa Mariana Garcia.

O relato de Mariana não se refere a uma universidade qualquer, mas a maior instituição de ensino superior do Brasil, referência de qualidade em vários campos científicos: a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Seu depoimento ao ICL Notícias retrata um dos inúmeros problemas enfrentados no dia a dia por grande parte dos 69.200 estudantes, 4.242 professores e 8.802 servidores da UFRJ. Estruturas precárias, terceirizados com pagamentos atrasados, dificuldades orçamentárias e salas sem climatização são problemas constantes na instituição.

No governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a universidade viveu uma verdadeira “queda livre” nos números do orçamento, convivendo com inúmeros contingenciamentos. Em 2023, o governo Lula voltou a ampliar recursos, mas ainda em bases insuficientes para as necessidades das instituições, segundo servidores e alunos. A universidade convive com dívidas que chegam a R$ 61 milhões.

Em nota enviada ao ICL Notícias, a UFRJ afirmou que nos últimos 12 anos, o orçamento discricionário da universidade caiu quase pela metade. O valor aprovado para 2025 é de R$ 406.165.0480,00, dos quais R$ 391.126.108,00 são destinados a despesas correntes (de custeio).

Uma inspeção recente feita pela UFRJ apontou que apontou que 75% dos 154 prédios da instituição precisam de obras de recuperação para continuar funcionando. O custo estimado das intervenções é de R$ 1 bilhão.

“A UFRJ enfrenta uma crise financeira dramática. O governo atual tem tentado aumentar o orçamento do MEC, porém temos um passivo emergencial grande dos anos anteriores”, explica o professor Rodrigo Fonseca, diretor do AdUFRJ, sindicato dos professores da instituição.

Estudantes em greve pela melhoria nos transportes

No primeiro semestre de 2024, segundo o AdUFRJ, apenas três dos 74 trabalhos de campo previstos pelo Instituto de Geociências, que abriga cursos como Geografia e Geologia, foram realizados. A frota oficial da universidade para os trabalhos de campo tem dez ônibus. Os mais novos são de 2010. O mais antigo, de 2005. No caso das vans, são 22 fabricadas entre 2005 e 2011. A lei exige que 20% da carga horária dos cursos do instituto seja em campo.

Em reunião com representantes dos cursos, a reitoria da UFRJ apresentou uma possível solução temporária para o problema, que seria a terceirização dos transportes. Até o momento, porém, o plano não foi colocado em prática. Diante dos problemas, estudantes do curso de Geologia entraram em greve estudantil até que uma solução seja colocada em prática.

“Os estudantes de Geologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro seguem em greve até que possamos estudar com dignidade e com a segurança que merecemos”, diz o comunicado do Diretório Acadêmico.

Procurada, a UFRJ afirmou que, por conta do “subfinanciamento”, “tem como medida de
redução de gastos a diminuição da frota oficial, que gera o custo de R$ 2 milhões anuais em manutenção”.

“Para atender às demandas de viagens, a Universidade está firmando um contrato de locação de ônibus, vans e micro-ônibus para uso programado, conforme a necessidade. A previsão é de que esse contrato entre em vigor até o início do segundo semestre de 2025”, completou.

Prédio de Educação Física da UFRJ está fechado desde 2023

Um dos principais problemas estruturais da Universidade Federal do Rio de Janeiro sé o prédio da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD), na Ilha do Fundão, Zona Norte do Rio. O edifício está fechado desde 2023 por conta de dois desabamentos.

O primeiro desabamento na Escola de Educação Física e Desportos foi em setembro de 2023. Na época, parte da marquise do prédio desmoronou. O último ocorreu em maio de 2024, quando a parede de um corredor caiu.

Muro desabou na Escola de Educação Física da UFRJ, na Ilha do Fundão. (Foto: Reprodução)

A interdição do prédio, que seria temporária, persiste até o momento, sem previsão para a conclusão das obras. Enquanto isso, os estudantes dos cursos de Educação Física e Dança precisam se deslocar por vários prédios da UFRJ para conseguir realizar as aulas.

“A gente fica rodando e as aulas são umas atrás da outras. Uma aula que era para durar duas horas, eu tenho uma hora porque o professor tem que começar mais tarde para esperar os alunos se deslocarem até o local. Isso aí a gente já perde”, relata Melanie Caires, representante do Centro Acadêmico dos estudantes de Educação Física. Por causa dos dois incidentes, os cursos de graduação em Educação Física e Dança não receberam alunos novos no primeiro semestre deste ano.

Após inúmeros protestos dos estudantes, quinzenalmente ocorrem reuniões entre representantes dos alunos e a reitoria. Os alunos relatam que já receberam inúmeros prazos e promessas. Inicialmente, havia a ideia de se construir estruturas provisórias, como contêineres, para a realização de algumas atividades. O projeto, porém, não saiu do papel. Quando forem iniciadas, as obras de reforma do prédio da Escola de Educação Física e Desportos têm previsão de duração de dois anos.

“Eu não acredito mais nada do que eles falam. Eu fico confiante, fico esperançosa, mas acreditar é uma palavra muito forte, porque nos contêineres eles falavam que chegariam em outubro de 2024 e a gente já tá em abril do ano seguinte e não chegou. Eu fico com um pé atrás”, diz Melanie Caires.

Melanie também relata problemas em outros prédios, como a falta de água e a ausência de climatização.   “Os ginásios não têm climatização alguma. Em janeiro e fevereiro, no verão, era um calor insupórtavel e a gente  não podia usar o banheiro para tomar banho. Só tinha um banheiro disponível e um vaso para utilizar”.

Em nota, a UFRJ  disse que “a reforma da cobertura dos blocos A e B do prédio da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD) é considerada prioritária pela UFRJ. O projeto básico da obra está sendo elaborado pelo Escritório Técnico da Universidade (ETU). Durante a reforma, os ginásios vão ser ocupados com as disciplinas práticas, enquanto os contêineres, que serão alugados por 24 meses, tempo estimado para conclusão da obra, servirão de vestiários”.

“Os ensaios técnicos para verificação do estado da cobertura dos ginásios já estão sendo realizados. O laudo será emitido no dia 25 de maio”, completou.

Fachada do prédio da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD). (Foto: Elisângela Leite)

Bandejão sofre com atrasos nos pagamentos a funcionários terceirizados

Um dos pilares para a manutenção de estudantes, sobretudo dos que apresentam vulnerabilidade social, na universidade, o restaurante universitário da UFRJ também passa por problemas. No último mês, funcionários terceirizados do restaurante universitário paralisaram as atividades devido ao atraso no pagamento dos salários. Em apoio aos trabalhadores, os próprios estudantes se mobilizaram e serviram as refeições.

No último mês, terceirizados do restaurante universitário paralisaram as atividades devido ao atraso no pagamento dos salários. (Foto: Reprodução/ Redes Sociais)

Os funcionários do restaurante universitário alegavam que estavam com salário atrasado e sem receber benefícios. Também há denúncias de falta de depósito do FGTS pela empresa terceirizada Nutrienergy, responsável pelo restaurante desde 2022. O “bandejão” serve refeições no valor de 2 reais para os estudantes.

Sobre o restaurante universitário, a UFRJ afirma que “os pagamentos feitos à empresa Nutryenerge Refeições Industriais LTDA estão em dia. Os contratos com a empresa são para o fornecimento de refeição. A contratação de mão de obra é de responsabilidade da empresa. Durante a paralisação dos terceirizados, a UFRJ acompanhou os acontecimentos e cobrou para que a situação se normalizasse, dentro do previsto nos contratos”.

‘Professores estão sobrecarregados’, diz diretor de sindicato

Os problemas da UFRJ também tem afetado o desempenho e o dia a dia dos professores e funcionários da maior universidade federal do Brasil. De acordo com o professor Rodrigo Fonseca, muitos docentes relatam o uso de recursos próprios para garantir o funcionamento mínimo de aulas práticas e atividades de campo.

“Os professores estão sobrecarregados por tentarem manter as atividades mesmo diante da falta de recursos. Há frustração e indignação com o sucateamento progressivo da universidade, que compromete a formação dos alunos e o desenvolvimento científico”, afirmou.

Leia a íntegra da nota da UFRJ

“A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) informa que:

● Nos últimos 12 anos, o orçamento discricionário da Universidade caiu quase pela metade. O valor aprovado para 2025 é de R$ 406.165.0480,00, dos quais R$ 391.126.108,00 são destinados a despesas correntes (de custeio), que incluem o pagamento de água, luz, serviços de limpeza e segurança;

● Inspeção recente apontou que 75% dos 154 prédios da UFRJ precisam de obras de recuperação para continuar funcionando. O custo estimado das intervenções é de R$ 1 bilhão;

● A reforma da cobertura dos blocos A e B do prédio da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD) é considerada prioritária pela UFRJ. O projeto básico da obra está sendo elaborado pelo Escritório Técnico da Universidade (ETU). Durante a reforma, os ginásios vão ser ocupados com as disciplinas práticas, enquanto os contêineres, que serão alugados por 24 meses, tempo estimado para conclusão da obra, servirão de vestiários. Atualmente, as aulas são ministradas fora do prédio da EEFD, em outras unidades acadêmicas, em dois campi da UFRJ: na Cidade Universitária e na Praia Vermelha. Os ensaios técnicos para verificação do estado da cobertura dos ginásios já estão sendo realizados. O laudo será emitido no dia 25 de maio;

● Em relação ao funcionamento dos restaurantes universitários (RUs): os pagamentos feitos à empresa Nutryenerge Refeições Industriais LTDA estão em dia. Os contratos com a empresa são para o fornecimento de refeição. A contratação de mão de obra é de responsabilidade da empresa. Durante a paralisação dos terceirizados, a UFRJ acompanhou os acontecimentos e cobrou para que a situação se normalizasse, dentro do previsto nos contratos;

● Tendo em vista o cenário de subfinanciamento, a UFRJ tem como medida de redução de gastos a diminuição da frota oficial, que gera o custo de R$ 2 milhões anuais em manutenção. Para atender às demandas de viagens, a Universidade está firmando um contrato de locação de ônibus, vans e micro-ônibus para uso programado, conforme a necessidade. A previsão é de que esse contrato entre em vigor até o início do segundo semestre de 2025″.

 





Fonte: ICL Notícias

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